Monday, August 29, 2005

Imortalidade
A ânsia para que nos apresentem diariamente a imagem da juventude, não nos deixa intuir que é essa mesma ilusão que nos tornará inevitavelmente invisíveis.



Pagamos a peso de ouro o único verbo que não permanece

Tuesday, August 23, 2005

Lampejos
Nos últimos anos o teu olhar estava oculto no dele. Por vezes surgias num brilho inesperado e eu ficava à espera de mais. Preso ao momento. Quando ele também partiu, aceitei então que a verdade dos factos não residia apenas na substância.


A genética serve única e exclusivamente parte do todo

Friday, August 19, 2005

Rescaldo
Restam inícios de tarde devorados por nevoeiros lamacentos. Vidas atravessadas pelo inferno. Resta a opacidade da mata carbonizada e os focos de incêndio lá longe que se assemelham a lava e ainda o medo de atravessar uma realidade sufocante, irrespirável.




Não há enquadramento possível para a angústia e a devastação em directo

Monday, August 15, 2005

Putrefacção incipiente
Viro a cara para não ver os animais mortos na berma da estrada. Transfiro-me para cenários de guerra e estradas onde corpos inanimados de seres humanos permanecem ao abandono. Nas aulas de código ensina-se que não se trava perante um animal. Às tropas em guerra ensina-se-lhes que ou matam ou morrem.



A sobrevivência clarifica as regras do jogo

Saturday, August 13, 2005

A utopia da sensibilidade
Afinal os homens choram
É-lhes negado, sim, sonhar,
mas porque é inoportuno.


Não há tempo para a face humana de Deus

Friday, August 12, 2005

Se te disser que me irritam os dias de praia, dirás que minto.
Que me envolvo em areia e mar e aparentemente me queimo sem medo ao sol. Mas de facto é tudo um enorme fingimento. Espero apenas que o dia termine para que possamos retornar à nossa confortável monotonia.



Tenho propensão para gastar o tempo à toa

Thursday, August 11, 2005

A recusa invariável da constatação
do vazio absoluto consome-me.
Minto
Repetitivamente.
Decifras nas entrelinhas,
por silenciar,
Resquícios
obscenos de mim.



Nada do que digo se supõe que faça sentido

Wednesday, August 10, 2005

Refracção
Retirei a fotografia do caixilho
e rasguei-a. Metodicamente.

O seu enquadramento
no meu presente
tornara-se desfocado.


Ainda não há software para retoque de passados

Expus-me
num primeiro grito de vida.
Anotaram "cesariana".
Na verdade foi "parto natural".
Mas isso é absolutamente irrelevante.

Termos técnicos.
Apenas.


Poucos factos correspondem a observações correctas
Dicotomia
Lavrar-te-ei a carne
Inflado de ar e algodão
Destilarás éter e paz.
O som de um telemóvel

O teu
Atendo
Pai? Pai…

Ouve-se mal
Diz filho…
Gosto de ti…
E eu de ti
A chamada cai
Desligo a máquina
Hora do óbito
14h.55m


Nenhuma verdade é absoluta